terça-feira, 29 de agosto de 2023

Rede de mulheres negras discute mudanças climáticas e propõe incidência em políticas públicas

Rede Vozes Negras pelo Clima reúne onze mulheres de oito estados para discutir e propor políticas climáticas

Por Bruna Hercog |  Brasil de Fato - Bahia

Rede Vozes Negras pelo Clima reúne onze mulheres de oitos estados, moradoras e ativistas de comunidades periféricas urbanas, quilombolas, pesqueiras e ribeirinhas - Arpoador Comunica Filmes

Historicamente no Brasil as populações negras e indígenas, em especial as mulheres, são as mais afetadas pelas mudanças climáticas. São elas que há séculos denunciam o racismo ambiental que sofrem em seus territórios: falta de saneamento básico, água, coleta de lixo, desapropriação, violências de todos os tipos. São elas também que desenvolvem uma série de tecnologias sociais e ancestrais para construir soluções comunitárias. No entanto, na hora da formulação de políticas públicas para a área climática, essas vozes não são escutadas.

Para mudar esse cenário, onze lideranças negras de periferias urbanas, comunidades quilombolas, pesqueiras e ribeirinhas de oito estados do Brasil (Bahia, Ceará, Goiás, Pernambuco, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Maranhão, São Paulo) estão articuladas na Rede Vozes Negras pelo Clima. Uma das ações previstas é a participação na 28ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2023 (COP28), que acontece entre 30 de novembro e 12 de dezembro, em Dubai, Emirados Árabes Unidos.

“A injustiça climática e o racismo ambiental impactam diretamente os nossos corpos. Nós é quem estamos a frente das diversas formas de cuidado. Não é escolha, é sobrevivência, é pelo bem viver. Desde as organizações dos quilombos na época escravocrata, passando pelas migrações climáticas, somos nós que estamos a frente do desenvolvimento de tecnologias ancestrais. Por isso, precisamos estar também no processo de formulação de políticas climáticas”, ressalta Camila Aragão, uma das lideranças que integram a Rede.

Moradora do bairro de Cassange, em Salvador e atuante em uma série de organizações, ela se apresenta como mulher negra, com baixa visão, ativista, arte educadora, defensora dos Direitos Humanos e agente comunitária de saúde.

Em Cassange, Camila integra a equipe de um projeto de pesquisa de gestão dos resíduos sólidos urbanos, desenvolvendo uma proposta de manejo apropriado para catadores e catadoras. “Aqui é um território bem atípico. Apesar de urbano, o condomínio do Minha Casa Minha Vida é uma favela vertical que está instalada dentro de uma Área de Proteção Ambiental (APA), rodeada por quilombos, zonas rurais, ribeirinhas e ocupações. E quem está à frente do cuidado, do plantio, do gerenciamento dos resíduos são as mulheres negras”, conta.

Nas comunidades pesqueiras da Bahia também são as mulheres negras que estão à frente da defesa do território, do cuidado coletivo, da criação de soluções para garantir dignidade às famílias. Maria José Pacheco, a Zezé, que também integra a Rede Vozes Negras pelo Clima, explica que são as mulheres que ficam no território quando ele está sob ameaça, sofrendo diretamente as consequências da crise climática e dos chamados “projetos de desenvolvimento” que não levam em conta os direitos das populações locais.

Embora as mudanças climáticas impactem mais diretamente mulheres negras e indígenas, elas não costumam ser ouvidas nas formulações de políticas climáticas / Arpoador Comunica Filmes


“São as mulheres lutam em defesa dos seus territórios. Os homens migram para outros estados para buscar outras oportunidades de trabalho e as mulheres ficam com suas famílias no território. As mulheres estão nos manguezais com seus corpos e, quando tem problema, são elas primeiras que sentem. Elas estão nos rios, nos estuários. Elas estão com a presença física. As mulheres também têm um jeito de trabalhar pensando para as presentes e futuras gerações. Esse jeito de trabalho garante que os recursos tenham para hoje e para amanhã e para as futuras gerações”, pontua.

Assistente social, Zezé Pacheco trabalha há 20 anos com comunidades pesqueiras. É membro do Conselho Pastoral de Pescadores (CPP), da coletiva Mahin e Especialista em Direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais pela Faculdade de Direito da UFBA. Ela atua assessorando o movimento de pescadores e pescadoras artesanais na Bahia e também a nível nacional.

“O racismo ambiental é uma coisa a ser combatida e nós temos feito isso na base de nossa atuação porque assim, os governos e as empresas, eles identificam alguns territórios como zonas de sacrifício, lugares em que a vida, a história, o legado, a ancestralidade das pessoas e suas comunidades não importam, podem serem destruídas. Nós atuamos para impedir e denunciar isso”, reforça Zezé.

Direitos humanos e crise climática

A última edição do Informe “O Estado Dos Direitos Humanos no Mundo” (2022/2023), lançado anualmente pela Anistia Internacional, apontou que as populações negras e indígenas seguem sendo desproporcionalmente afetadas pelas violações do direito à alimentação, à saúde, à moradia, ao trabalho e à assistência social, entre outros.

De acordo com o relatório, o impacto dos desastres causados pelos efeitos da mudança climática e pela omissão do Estado em adotar medidas adequadas e suficientes para mitigá-los segue maior entre as comunidades marginalizadas, as mais afetadas pela falta de políticas públicas de habitação, saneamento básico e infraestrutura.

Ainda de acordo com o estudo, apenas nos primeiros cinco meses de 2022 foi registrado o maior número de mortes em uma década em decorrência de chuvas extremas. A maioria das pessoas afetadas era de mulheres negras moradoras de favelas e de bairros marginalizados, que estavam em casa quando aconteceram os deslizamentos e as enchentes.

Para Tâmara Terso, jornalista, pesquisadora e assessora de Direitos Humanos do projeto Mulheres Negras e Justiça Climática, da Anistia Internacional, é preciso denunciar a crise climática como uma crise dos direitos humanos. “A crise climática é uma crise de direitos humanos, é uma face da violência racial, do racismo ambiental. Por isso, é fundamental pressionar os tomadores de decisão para que as vozes das mulheres negras sejam consideradas na elaboração de soluções para essa crise”, defende.


A rede pretende fazer com que sejam ouvidas as vozes das mulheres negras mais impactadas pelas mudanças climáticas / Arpoador Comunica Filmes

Ela explica que denunciar a crise climática como uma crise de direitos humanos inverte o sentido de pensar as soluções. “Os tomadores de decisão das grandes empresas, hoje chamadas de ‘limpas’, adotam responsabilidades sociais e ambientais, mas que não passam de protocolos. A agenda de justiça socioambiental antirracista tem que pensar o combate ao racismo, a promoção de direitos das pessoas negras e povos e comunidades tradicionais e a efetivação dos direitos fundamentais dessas pessoas como primeira estratégia para se pensar políticas de combate às mudanças climáticas”, ressalta.

Tâmara explica, ainda, que as soluções que estão sendo elaboradas nos espaços recentes de decisão instituídos pelo governo federal no Brasil, entre eles a própria participação na COP, tem focado em soluções para a crise climática que envolvem a captura e venda de carbono, o investimento em energias consideradas limpas, entre outras estratégias que muitas vezes violam os territórios.

“A mudança de matriz energética que deixa de explorar combustíveis fósseis para explorar energia eólica está agredindo o meio ambiente, desapropriando famílias e violando o direito das comunidades que estão nesses territórios”, denuncia.

Zezé Pacheco argumenta que são as mulheres que lutam pela defesa dos territórios / Arpoador Comunica Filmes


Entre as soluções apontadas pelas lideranças quilombolas, ribeirinhas, pesqueiras e aquelas com atuação nas periferias urbanas estão o investimento na agricultura familiar, a organização de processos de efetivação ao direito ao meio ambiente, às águas, aos rios, o fomento aos processos de extrativismo tradicional numa interação entre terra e cultivadoras, em contraponto ao extrativismo predatório. São estratégias que já vem sendo desenvolvidas pelas onze lideranças que integram a Rede Vozes Negras pelo Clima, a exemplo de Camila Aragão e Zezé Pacheco, na Bahia.

“Essas mulheres apontam que é impossível construir uma transição energética, um processo de combate às mudanças climáticas sem resolver os problemas básicos do país, sobretudo, das comunidades como a falta de saneamento, acesso à educação, ao trabalho e renda nessas comunidades”, conclui Tâmara.

Mulheres Negras e Justiça Climática


A Rede Vozes Negras pelo Clima é parte do projeto Mulheres Negras e Justiça Climática, da Anistia Internacional, que visa expandir as vozes de mulheres negras a partir de seus territórios para denunciar o racismo ambiental que sofrem, mas também as soluções que desenvolvem. O objetivo do projeto é construir uma agenda antirracista que seja incluída na pauta regional, nacional e internacional da construção de políticas para combater as mudanças climáticas.

“Queremos, portanto, amplificar as vozes de mulheres negras para denunciar o racismo ambiental que sofrem, mas também amplificar as tecnologias sociais e ancestrais que essas mulheres empreendem nesses territórios violados para construir formas de existência, resistência, modos de vida e soluções para as mudanças climáticas”, explica Tâmara Terso.

Ela sinaliza que a rede foi sendo formada aos poucos, a partir das conexões estabelecidas pelas lideranças nos distintos territórios. “Em 2023, se estabeleceu com autonomia e tem construído processos importantes de fortalecimento institucional, que caminham ao mesmo tempo que os processos de formação nos temas dos acordos e conceitos sobre mudanças climáticas”, destaca a assessora.

Camila Aragão destaca que a injustiça climática e o racismo ambiental impactam diretamente os corpos das mulheres negras / Arpoador Comunica Filmes

O projeto prevê cinco encontros presenciais de formação. Já foram realizados três, na Escola Nacional Florestan Fernandes, em São Paulo. A expectativa é que em 2024 sejam realizados intercâmbios que vão proporcionar o encontro das lideranças pelos oito estados e distintos territórios para fortalecer os processos de incidência e elaboração de projetos e fomento de políticas de ação climática.

Para Camila Aragão, participar da Rede é uma forma de fortalecer a luta. “Unir onze mulheres negras potentes e engajadas na luta de diferentes lugares do Brasil é extraordinário. Um impacto gigante. A diversidade macro da rede, inspira e ensina a trabalhar com o recorte menor nos territórios, empodera e enriquece”, afirma.

COP 28


Em sua 28ª edição, a COP (sigla para Conferência das Partes, no inglês Conference of the Parties) vai reunir os 199 países membros que assinam a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (UNFCCC), responsável por estruturar as prioridades frente às ondas de calor, aquecimento dos oceanos, secas, enchentes e outros problemas ambientais. A COP é realizada anualmente pela ONU e reúne diplomatas, representantes dos governos e de organizações da sociedade civil. O objetivo é revisar os posicionamentos e ações de cada país, além de revisitar o inventário de emissões de gases de efeitos estufa. A primeira edição da COP foi em Berlim, em 1995.

Na COP 28 as lideranças que integram a Rede Vozes Negras pelo Clima pretendem pautar o debate sobre raça e clima, apontando as religiões de matriz africana e indígenas como impulsionadoras de cinturões de defesa do clima, à medida que são espaços permanentes de educação ambiental. Por isso, acreditam que é importante que as religiões afro-indígenas sejam parceiras no combate à crise climática.

Para Zezé Pacheco, é fundamental que as populações negras e indígenas participem diretamente de espaços estratégicos de incidência política, a exemplo da COP. “A maioria da população que é atingida pelos efeitos das mudanças climáticas é negra, de comunidade tradicional, são as populações periféricas, as populações indígenas. No entanto, quando tem um processo de advocacy, de participação em fóruns nacionais e internacionais, vai acontecendo o embranquecimento de quem tem condições de ter voz e vez”, aponta.

Outra ação de incidência prevista para acontecer no evento é a apresentação de um relatório que vai denunciar as violações de direitos humanos que acontecem nos territórios onde vivem e lutam as onze lideranças da Rede e pautar uma agenda antirracista para as mudanças climáticas. “O que a gente espera é dar visibilidade às questões do racismo ambiental que as comunidades onde nós atuamos enfrentam, articular apoios nacionais e internacionais em defesa das comunidades e também interferir na política ambiental nacional e internacional, de forma que a contribuição das comunidades tradicionais, das comunidades negras, das mulheres, seja considerada nesses processos”, conclui Zezé.

Edição: Gabriela Amorim

quinta-feira, 24 de agosto de 2023

CPP-BA/SE realiza “Seminário sobre Terras Públicas”

Política de Regularização Ambiental, projeto Quilombo Legal, regularização fundiária de quilombo, Cadastro Ambiental Rural (CAR), Cadastro Estadual Florestal de Imóveis Rurais (CEFIR), destinação e posse de terras públicas foram assuntos discutidos durante o evento.

Com objetivo de promover justiça socioambiental para povos e comunidades de pesca artesanal e quilombo, com a demarcação e titulação do território tradicional, e enfrentamento de práticas de racismo e degradação ambiental, das violações de direitos humanos e conflitos territoriais, a realização do “Seminário sobre Terras Públicas” foi promovida pelo Conselho Pastoral dos Pescadores, entre os dias 22 e 23 de agosto de 2023, em Salvador.

Além de lideranças do Movimento de Pescadoras e Pescadores (MPP) e da Articulação Nacional de Quilombos (ANQ), quilombolas, marisqueiras, pescadoras e pescadores, o evento reuniu servidores públicos da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), e das Secretarias de Desenvolvimento Rural (SDR) e Meio Ambiente do Estado da Bahia (Sema).

Durante a programação do seminário, a coordenadora geral de Habitação e Regularização Fundiária na SPU, Hayla Ximenes, destacou a legislação federal para regularização fundiária. O assessor especial da Sema, Aldo Carvalho, pontuou sobre a regularização ambiental, com destaque para o Cadastro Ambiental. E o diretor-geral da Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), vinculada à SDR, Alexandre Simões, apresentou o projeto Quilombo Legal como estratégia adotada pelo Estado da Bahia para a regularização de quilombo.

Para a coordenadora geral de Habitação e Regularização Fundiária na SPU, Hayla Ximenes, a Lei Federal nº 13.465, de 11 de julho de 2017, é importante para o processo de regularização fundiária, porque o texto dessa lei apresenta a previsão de concessão do Termo de Autorização de Uso Sustentável (TAUS) para uso sustentável de terrenos de domínio da União. O TAUS é um dos instrumentos utilizados no processo de regularização fundiária de quilombo.

De acordo com a Portaria Federal nº 89, de 15 de abril de 2010, o "Termo de Autorização de Uso Sustentável (TAUS) poderá ser concedido a comunidades tradicionais que ocupem ou utilizem áreas da União, a exemplo de áreas de várzeas e mangues enquanto leito de corpos d' água federais; mar territorial, áreas de praia marítima ou fluvial federais; ilhas situadas em faixa de fronteira; acrescidos de marinha e marginais de rio federais; e terrenos de marinha e marginais presumidos.

A expressão “terras públicas” inclui terras devolutas, que são áreas sem destinação pelo Poder Público e que não possuem uso comum ou patrimônio particular. Embora o Estado da Bahia possua leis e decreto sobre destinação de terras públicas a comunidades tradicionais, há 332 processos abertos para regularização fundiária de territórios quilombolas, conforme informação publicada no documento intitulado “Relação de processos de regularização de territórios quilombolas abertos”, publicado no dia 06 de abril de 2023, disponível no site do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Etapas para abertura de processo para regularização fundiária de quilombo pelo Estado da Bahia:

  • Ata da Assembleia comprobatória de que os integrantes da comunidade estão de acordo com o pedido de regularização fundiária de quilombo;
  • Cópia dos documentos de fundação da Associação; Ata de Eleição da Diretoria Geral; Estatuto Social registrado em cartório; identidade do responsável legal da Associação; CNPJ da Associação.
  • Cópia da Certidão de Autorreconhecimento emitida pela Fundação Cultural Palmares (FCP). Clique aqui para saber como obter a Certidão de Autorreconhecimento emitida pela FCP.
Vídeo explicativo " Obter Certidão de Autodefinição de Comunidade Remanescente de Quilombo - Portal de serviços":



Onde solicitar abertura de processo para regularização fundiária de quilombo pelo Estado da Bahia:


O que diz a legislação sobre direitos sociais e a destinação de terras públicas a povos e comunidades tradicionais?

A Convenção n° 169 sobre Povos Indígenas e Tribais da Organização Internacional do Trabalho (OIT) está em vigência no Brasil pelo Decreto nº 10.088, de 05 de novembro de 2009, em que consiste os direitos inseridos pela Convenção 169, verifica-se vedação à retirada das terras que ocupam (Art. 16).

A Lei Federal nº 13.465, de 11 de julho de 2017, "dispõe sobre a regularização fundiária rural e urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e sobre a regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal; institui mecanismos para aprimorar a eficiência dos procedimentos de alienação de imóveis da União; e dá outras providências."

Aqui, no Estado da Bahia, a Lei Estadual nº 12.910, de 11 de outubro de 2013, “dispõe sobre a regularização fundiária de terras públicas estaduais, rurais e devolutas, ocupadas tradicionalmente por Comunidades Remanescentes de Quilombos e por Fundos de Pastos e Fechos de Pasto e dá outras providências: Art. 1º - Fica reconhecida a propriedade definitiva das terras públicas estaduais, rurais e devolutas, ocupadas pelas Comunidades Remanescentes de Quilombos”.

A Portaria nº 129/2021, “institui Grupo de Trabalho com a finalidade de promover estudos, propor medidas, compartilhar informações e acompanhar os processos de Regularização Fundiária das áreas coletivas de comunidades remanescentes de Quilombos, visando ao seu aperfeiçoamentos

A Instrução Normativa SDR/SEPROMI nº 01/2018, “dispõe sobre o procedimento de regularização fundiária de terras públicas, estaduais, rurais e devolutas ocupadas tradicionalmente por Comunidades Remanescentes de Quilombos do Estado da Bahia.

A Lei Estadual nº 13.182, de 06 de junho de 2014, “institui o Estatuto da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa do Estado da Bahia, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, defesa de direitos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e demais formas de intolerância racial e religiosa”.

O Decreto Estadual nº 15.634, de 06 de novembro de 2014, “institui a Política Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, altera o Decreto nº 13.247, de 30 de agosto de 2011, e dá outras providências”.

O Decreto Estadual nº 20.306, de 12 de março de 2021, “institui o Conselho Estadual para a Sustentabilidade dos Povos e Comunidades Tradicionais, e dá outras providências”.

O Decreto Estadual nº 20.307, de 12 de março de 2021, “altera o Decreto nº 15.634, de 06 de novembro de 2014”.

terça-feira, 22 de agosto de 2023

Nota de solidariedade à Alzeni Tomáz












O Conselho Pastoral dos Pescadores(as), regional Bahia e Sergipe (CPP-BA/SE), vem a público manifestar nosso apoio e solidariedade à companheira de lutas, conselheira e integrante do CPP, Alzeni Tomáz.

Alzeni é também pesquisadora da Sociedade Brasileira de Ecologia Humana (SABEH), e foi perseguida por 9 km, ao sair da Terra Indígena Truká-Tupan, em Paulo Afonso (BA), na última terça-feira (15/8/2023), após realizar atividades com aquele povo.

Ela vem há alguns anos acompanhando o povo Truká-Tupan e tem sido voz atuante na luta em favor e em defesa das comunidades tradicionais, aliando militância e pesquisa.

Na mesma semana em que mãe Bernadete foi assassinada, por também defender seu território Quilombola, a companheira Alzenir sofre essa perseguição. Para nós essa onda de violência, é fruto da morosidade da justiça em punir os assassinos, bem como do governo brasileiro em titular e garantir a vida do povo em suas terras e territórios.

É patente que o Governo Brasileiro e, em especial o governo da Bahia, precisam lançar estratégias mais eficientes e eficazes, na proteção de ativistas, estudiosos, lideranças de comunidades tradicionais e originárias. É preciso estancar esse derramamento de sangue, que já dura mais de 500 anos.

Vale destacar que em janeiro deste ano, a cacica Erineide Truká-Tupan sofreu um ataque a tiros, o que resultou na inclusão dela e de toda a comunidade no Programa Estadual de Proteção aos Defensores e Defensoras de Direitos Humanos (PEPDDH), porém os ataques e perseguições não cessam.

O povo Truká-Tupan, por lutar em defesa de seu território, suas terras, sua cultura, vem sofrendo muitos atentados e ameaças. Está apenas no Programa Estadual de Proteção aos Defensores e Defensoras de Direitos Humanos, não garante a vida e nem a segurança desses povos, e nem de seus apoiadores.

O Conselho Pastoral dos Pescadores(as) aproveita o momento para salientar a necessidade de se combater a violência em todos os seus níveis e formas, principalmente neste momento em que ainda vivemos a retomada dos processos democráticos e de direito.

Precisamos de ações e políticas públicas de inclusão, como também com punições cabíveis, legais e jurídicas a todos esses crimes que atentam contra a vida.

Demarcação já e não ao Marco Temporal!

quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Após um mês de reuniões realizadas na sede da SPU, do Incra e do MDH, em Brasília, comunidades de pesca artesanal e quilombola ainda aguardam retorno de servidores federais.

Representações do Movimento de Pescadoras e Pescadores Artesanais (MPP) e da Articulação Nacional de Quilombos (ANQ), situadas nos estados da Bahia, Minas Gerais e Sergipe, participaram de reuniões para requerem atenção aos direitos humanos dos povos e comunidades tradicionais, agilidade dos processos de regularização fundiária, intervenção do poder público diante dos conflitos socioambientais que atingem territórios tradicionais.

Representações do MPP e ANQ reuniram-se na sede da SPU, em Brasília, para tratar dos processos de regularização fundiária de territórios tradicionais em terras da União, nos estados da Bahia, Minas Gerais e Sergipe. Foto: Arquivo do MPP/ANQ.

Para entrega de dossiê relacionado a uma série de ondas do mar de lutas por direitos humanos, socioambientais e territoriais, representações do Movimento de Pescadores e Pescadoras (MPP) e da Articulação Nacional de Quilombos (ANQ), situadas nos estados da Bahia, Minas Gerais e de Sergipe, percorreram cerca de três mil quilômetros. A entrega do documento foi realizada durante reuniões de incidência política na sede da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDH) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.

Reunião de incidência política na sede do Incra. Foto: Arquivo do MPP/ANQ. 
Dentre as propostas apresentadas pelas representações de quilombolas, marisqueiras, pescadores (e pescadoras) artesanais, destacam-se ações de preservação da vida diante do aumento de situações de conflitos socioambientais, segurança alimentar e agilidade dos processos de regularização fundiária de territórios tradicionais. No dossiê, as representações sociais reuniram laudos técnicos e pareceres oficiais, relatos de denúncia, breve histórico e contexto da situação de conflito socioambientais e territoriais, além de um clipping jornalístico relacionado às questões das comunidades tradicionais.

Uma quilombola, que não pode ter a sua identidade revelada, da comunidade de Cambuta, situada no município de Santo Amaro, Recôncavo da Bahia, informou aos poderes públicos que a comunidade tem sido local de despejo de lixo e destroços produzidos pela empresa MEZ Construções. “Essa empresa não trata e deixa o lixo dentro do Rio Ibitinga e dentro do manguezal [como se observa nas imagens abaixo]. O mangue está praticamente morto” relatou a quilombola.

Área de manguezal degradada por destroços deixados pela empresa MEZ Construções. Foto enviada por uma moradora do quilombo Cambta, situado no município de Santo Amaro - Recôncavo da Bahia.

À Secretaria de Patrimônio da União (SPU), as representações reivindicaram acompanhamento e andamento dos processos de títulos de regularização fundiária das comunidades quilombolas. Em declaração conjunta, o MPP e a ANQ registraram denúncias de violações de direitos humanos, socioambientais e territoriais, apontaram o avanço de megaempreendimentos predatórios e a grilagem de terras da União, como uma do aumento da violência contra as comunidades, principalmente, localizadas nos estado da Bahia e Sergipe.

Representações do MPP e ANQ reuniram-se na sede da SPU, em Brasília, para tratar dos processos de regularização fundiária de territórios tradicionais em terras da União, nos estados da Bahia, Minas Gerais e Sergipe. Foto: Arquivo do MPP/ANQ.

A terceira reunião de incidência política foi na sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para tratar do cronograma de ações quanto à regularização fundiária de territórios quilombolas. Nessa reunião, em Brasília, foi definido que, no dia 25 de julho, ocorreria uma reunião na sede da Superintendência do Incra na Bahia, que, por sua vez, passa a contar com o acompanhamento das representações dos MPP e da ANQ, e buscará garantir maior atenção às comunidades que enfrentam as situações de conflitos em vários níveis de gravidade. 

Uma moradora da comunidade de Boca do Rio, localizada em Candeias, município da Região Metropolitana de Salvador, disse que o território pesqueiro existe há mais de 200 anos, mas a degradação ambiental e os conflitos socioambientais começaram a dificultar a vida plena das marisqueiras, pescadoras e pescadores artesanais, a partir da década 1980, após a instalação do Porto de Aratu - Candeias, pela Companhia das Docas do Estado da Bahia (Codeba). “Desde então, a gente vem sofrendo porque a Codeba colocou que nós somos invasores. A gente vem sofrendo com os impactos ambientais, principalmente, por causa das empresas que estão instaladas lá no Porto, como Brastemp e Bahia Terminais, que são empresas de gasoduto”, expôs a moradora de Aratu, em reunião na sede da SPU, no dia 05 de julho de 2023, em Brasília. 

Reunião de incidência política na sede do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDH), realizada no dia 06/07/2023, em Brasília.
Até a presente data, de acordo com documento intitulado “Relação de processos de regularização de territórios quilombolas abertos”, publicado no dia 06 de abril de 2023, disponível no site do Incra -, na Bahia, há 332 processos abertos para regularização fundiária de territórios quilombolas. No estado de Sergipe existem apenas 32 processos abertos referentes à regularização fundiária de comunidades quilombolas.

Quanto à obtenção de títulos já expedidos ou prestes a serem publicados, no último dia 30 de junho de 2023, o Incra publicou uma lista com a relação de territórios quilombolas. Na Bahia, 19 territórios quilombolas obtiveram ou aguardam a emissão do título de regularização fundiária. Em Sergipe, apenas seis territórios aguardam o andamento da titulação quilombola. O documento com a lista da relação de territórios com títulos expedidos está disponível neste link.

Para o reconhecimento e indenização de territórios quilombolas, reconhecidos pela Fundação Cultural Palmares, as comunidades precisam solicitar a abertura de processo de regularização de seu território nas superintendências regionais do Incra. O processo reúne fases e uma relação de documentos, composta por: “Relatório Técnicos de Identificação e Delimitação (RTID), emissão de portaria de reconhecimento do território quilombola, decretação do território como de interesse social, avaliação e indenização das terras dos ocupantes não-quilombolas, desintrusão dos ocupantes não-quilombolas e titulação”.

O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) acompanhou a reunião na sede do Incra, para tratar do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e do Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF) junto às comunidades quilombolas.

Até 04 de julho de 2023, a Fundação Cultural Palmares certificou 843 comunidades quilombolas no estado da Bahia. E, em Sergipe, 44 comunidades quilombolas foram certificadas.

sexta-feira, 4 de agosto de 2023

CPP realiza “Oficina de Comunicação com jovens de comunidades quilombolas e de pesca artesanal”

Na capital da Bahia, entre os dias 4, 5 e 6 de agosto, moças e rapazes, com idade entre 18 e 29 anos, participam de atividades da “Oficina de comunicação com jovens de comunidades quilombolas e de pesca artesanal”, realizada pelo Conselho Pastoral dos Pescadores - e Pescadoras - (CPP-BA/SE), em parceria com a Kindermissionswerk. Essa iniciativa inédita do CPP-BA/SE revela que essas juventudes não espelham a “geração nem-nem”, ao afirmarem que são jovens que estudam e buscam conhecer técnicas de comunicação para produção de conteúdos relacionados ao cotidiano dentro e fora das comunidades. O grupo de jovens representa 13 comunidades que ficam situadas em municípios dos estados da Bahia e Sergipe.

Foto: Ascom/CPP-BA/SE,

Foto: Ascom/CPP-BA/SE.
A programação da Oficina de Comunicação envolve duas conversas sobre “A importância da juventude na discussão sobre mudanças climáticas” e “Ativismo digital da juventude na organização dos jovens e da comunidade negra”, com a fundadora do Instituto Perifa Sustentável, Jovem Embaixadora da Organização das Nações Unidas (ONU) e ativista climática, Amanda Costa, que, em dezembro deste ano, participará da 28ª Conferência de Mudanças Climáticas da ONU (COP28), em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.

Foto: Ascom/CPP-BA/SE.
A secretaria-executiva do CPP-BA/SE, Zezé Pacheco, fez entrega de publicações impressas sobre a situação das comunidades quilombolas e de pesca artesanal, para a criadora de conteúdo e ativista Amanda Costa. Foto: Ascom/CPP-BA/SE.

Foto: Ascom/CPP-BA/SE.

Foto: Ascom/CPP-BA/SE.
Neste sábado e no domingo, dias 5 e 6 de agosto, as moças e rapazes farão leituras dinâmicas sobre a produção de comunicação e jornalismo comunitário, prática experimental de fotografia com uso de celular, prática de ferramentas digitais e uso de redes sociais. A programação ainda inclui um passeio cultural, que inclui degustação de iguarias geladas, pela Cidade Baixa de Salvador.

Durante esta sexta-feira, 4, a ativista climática Amanda Costa conversou sobre temas relacionados à justiça ambiental, racismo ambiental, resiliência climática, mudanças climáticas, direitos humanos, sociais e territoriais.
A ativista climática Amanda Costa. Foto: Ascom/CPP-BA/SE. 
“Eu fiquei muito honrada, muito grata, e me sinto muito feliz por poder criar esse espaço, transbordar um pouquinho do que eu sei e entender que a transformação vem da base e dos territórios [tradicionais]. Quando a nossa comunidade, de forma engajada, mobilizada e articulada, entender que a gente tem força para enfrentar tudo o que querem fazer contra nós, e a partir do momento que a gente se junta, que a gente se aquilomba, a gente consegue resistir para reexistir”, completou a ativista climática Amanda Costa, que também apresenta o programa de televisão “Tem Clima Pra Isso?”, é internacionalista e criadora de conteúdo.

O grupo de jovens espera colocar em prática toda troca de conhecimento adquirido durante a Oficina de Comunicação. A jovem e estudante, Nice Santos, da comunidade quilombola de Ilha do Tanque, situada no município de Maraú, Baixo Sul da Bahia, relata que o despejo irregular de lixo está destruindo uma área de manguezal. Esse é um caso típico de racismo ambiental, porque o lixão prejudica diretamente as/os moradoras/es da comunidade de Ilha do Tanque e outras formas de vida presentes nesse ecossistema litorâneo.
Foto: Ascom/CPP-BA/SE.
“A gente está correndo atrás referente a isso, para poder tentar evitar que o lixo chegue no nosso mangue. Então, essa luta é grande. Temos uma associação, e a gente conta com uma quantidade de jovens para lutar contra isso”, relatou a jovem Nice Santos. Ela acredita que a união das juventudes de comunidades provocará manifestações em diferentes espaços e formatos, seja presencialmente ou via mídias digitais por meio das redes sociais.

A “Oficina de comunicação com jovens de comunidades quilombolas e de pesca artesanal” integra um conjunto de ações de um projeto piloto do CPP-BA/SE, denominado “Crianças, Adolescentes e Jovens - Arte, Cultura e Comunicação: fortalecendo o território”. Com essa ação, o CPP-BA/SE realiza atividades práticas experimentais em comunicação e jornalismo comunitário, com foco na produção de conteúdos digitais informativos e na consolidação da "Rede de Jovens Comunicadoras/es de Comunidades Quilombolas e de Pesca Artesanal - Bahia e Sergipe".

Sobre o CPP

Desde 1968, o Conselho Pastoral de Pescadores (CPP) atua pelo bem viver de marisqueiras, pescadores e pescadoras artesanais, e em defesa dos territórios tradicionais. Com o objetivo de promover o fortalecimento dos territórios, a equipe do CPP da regional Bahia e Sergipe, realiza o projeto “Crianças, Adolescentes e Jovens – Arte, Cultura e Comunicação: fortalecendo o território”.

A missão do CPP que é “Movido pela força libertadora do evangelho, colaborar com os pescadores e pescadoras nos justos anseios de suas vidas, respeitando sua cultura, estimulando suas organizações, tendo em vista a libertação integral e a construção de uma nova sociedade.” Assim, o CPP busca promover valores comunitários, a cultura da solidariedade, a igualdade de raça e gênero e a democracia efetiva e participativa, tendo como princípio fundamental o protagonismo dos pescadores e pescadoras.

O projeto "Crianças, Adolescentes e Jovens - Arte, Cultura e Comunicação", iniciado em março de 2023, é um sonho antigo e, mais recentemente, se fortaleceu a partir da demanda de jovens que participaram da Assembleia Geral do CPP, em 2018, quando fizeram um apelo ao CPP, visando desenvolver trabalhos com os jovens e adolescente, frente ao crescimento da violência e da perda de direitos. O CPP topou o desafio e, inicialmente, junto com 13 comunidades quilombolas e de pesca artesanal, distribuídas em quatro microrregiões de trabalho, na regional Bahia e Sergipe, vem desenvolvendo atividades de arte, cidadania, cultura e comunicação, com crianças, adolescentes e jovens. E, com essa ação, o CPP busca promover a organização comunitária e a participação das juventudes e adolescentes que residem e resistem dentro das comunidades quilombolas e de pesca artesanal.
Equipe técnica do CPP, a ativista climática Amanda Costa e jovens de comunidades quilombolas e de pesca artesanal dos estados da Bahia e Sergipe. Foto: Ascom/CPP-BA/SE.